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3.5.19

Âşık Veysel - uma jóia rara


Completamente por acaso me deparei com o poeta e músico turco Âşık Veysel (1894-1973), ouvindo ao fan-tás-ti-co “The Blue of the Night” com Bernard Clarke, na RTÉ Radio 1 FM. Imediatamente a voz de Âşık e o sentimento que suas músicas transmitem - ele foi um Ashik, um cantor que acompanha sua própria música com um instrumento, segundo a tradição turca - me tocaram, e passei a ouvi-lo quase que obcecadamente!

A boa notícia é que grande parte de sua música pode ser ouvida gratuitamente no Spotify ou no YouTube!

Inspirado no sentimento que sua música causa, traduzi - direto do turco, é claro - um poema de Âşık:

Caminho um caminho longo e estreito


Caminho um caminho longo e estreito
Dia e noite caminho este caminho
Não sei em que parte do caminho estou:
Dia e noite caminhando este caminho.

No momento que vim a este mudo,
Já comecei a andar, e logo entrei
Neste palácio de duas portas distintas:
Dia e noite caminhando este caminho.

Eu caminho mesmo dormindo
E mesmo de olhos bem fechados
Eu acabo vendo os que se foram:
Dia e noite caminhando este caminho.

Quarenta e nove anos nessa estrada
Entre desertos, montanhas e vales,
Por terras estranhas fiz meu caminho:
Dia e noite caminhando este caminho.

Profundamente penso neste caminho,
Cujo destino parece estar muito longe,
Embora a estrada pareça curta e ampla:
Dia e noite caminhando este caminho

A esta altura do caminho, Veysel se pergunta
Se deveria rir ou chorar... O que seria o certo?
Com um destino ainda por alcançar:
Dia e noite caminhando este caminho.


Uzun ince bir yoldayım


Uzun ince bir yoldayım,
Gidiyorum gündüz gece,
Bilmiyorum ne haldeyim,
Gidiyorum gündüz gece.

Dünyaya geldiğim anda,
Yürüdüm aynı zamanda,
İki kapılı bir handa
Gidiyorum gündüz gece.

Uykuda dahi yürüyom,
Kalmaya sebep arıyom,
Gidenleri hep görüyom,
Gidiyorum gündüz gece

Kırk dokuz yıl bu yollarda
Ovada dağda çöllerde,
Düşmüşüm gurbet ellerde
Gidiyorum gündüz gece.

Düşünülürse derince,
Uzak görünür görünce,
Yol bir dakka miktarınca
Gidiyorum gündüz gece.

Şaşar Veysel iş bu hale
Gah ağlaya gahi güle,
Yetişmek için menzile
Gidiyorum gündüz gece

3.5.18

20180516

The Lovers II, 1928 by Rene Magritte
+ www.artsy.net
algo além do universo...
deve haver algo além do universo
que justifique ou explique esse amor:

depois da luz, além do próximo
no único ponto do mundo
sem movimento -
          não no corpo -
tampouco fora do corpo
          não na mente -
tampouco fora da mente
: lá se encontra o amor incondicional.

não indo nem vindo: parado
       sem inércia -
tampouco movimento
: passado e futuro diluidos
em presente
     sem ascenção -
tampouco declínio
apenas o ponto
       o ponto
parado do mundo em movimento
onde não há dança -
    e só há dança
: lá se ama
      o amor dos iluminados...

e eu, à luz de velas,
me pergunto, retoricamente:
como amar incondicionalmente
se ainda não sei desprender-me
do amor que sinto por ela?

19.5.17

Wellfish

You know when you go from here to there, looking everywhere, and you can't find what you're looking for, and this just keep you looking more, and more, and more...
down in the streets, in the trash bins
among mongers and beggars
what dignity means?
it's all you care once you got there
you need more, and more, and more...
that's your wish, and you can't resist...

Wellfish!

Only a dream

You may wake one day
In the other side of the line
Then you might ask, is this day
The day when you have died?


Only a dream, a dream
would death be only a dream?

You didn't redeem your sins
Everything was so fast
What does it really mean?
You didn't care to ask


Only a dream, a dream
is death only a dream?

Now you stand before the light
So bright, you have never seen
Have you awaken from the night?
Is there a new cycle to begin?


Only a dream, a dream
life was just a dream.

8.5.16

The Legend of The Ancient Druid Cemetery

and its cursed bones


And there he goes, and there he goes,
No turn around there where he goes.
Tiptoeing slowly to make no sound,
Even tiptoeing he felt in the ground
He stepped into something hard and dull
A whitened bone head shaped, a skull.
There were human bones spread all around
Among half-dug holes and tombstones,
What he was looking for he has found:
The Ancient Druid Cemetery and its cursed bones!


Jumping the tombs he walks through the bones
Gently not to break any nor the dead to disturb,
He carries a bag, I might have forgotten to say
Which makes his hard task even harder,
A corpse of a beloved one who passed away
Whom he aims to bring back from outer border
The corpse he carries, Eleonor is her name
Engaged they were, and about to get married,
All that he feels is sadness and regret
Eleonor he wants returned from the death,
And for that to happen he needs to bury
To bury Eleonor under the grounds and stones
of The Ancient Druid Cemetery and its cursed bones!


The tragic event that came to happen that night
When Jack had been drinking just a bit off his mark
He got home but she couldn't shut up, the bride,
So Jack had to hit her, but maybe he did too hard,
So he hit her again, to make sure she got it right:
“I'm sorry babe, as you, I also feel the pain,
But who's the boss, to myself I have to prove”
And he hit her again, till she could not move.
Now that she's gone he wants her back and well,
And the only way to do it, is to follow an old spell
About an ancient Druid cemetery, which says if you bury
A deceased beloved on the grounds of this cemetery
On the third day of the passing, no matter how depth
The tomb, they would return back from the death
from The Ancient Druid Cemetery and its cursed bones!


And so Jack did, he dug and dug a tomb for his beloved
On the grounds of the cemetery, wasting no more time
He was so anxious to have his beloved to him returned
So anxious to finish it quickly and then cover his crime
So he dug, the deepest she's buried the better she comes
He dug and buried her amid many others, amid other bones
He returned home to wait three days and three nights of endless time
He patiently waited three days and nights, as the legend was known
The Ancient Druid Cemetery and its cursed bones!


Three days and nights have passed, he'll finally remeet Eleonor
It was late night, darkness hours, when someone knocked his door
“Must be Eleonor”, he demands, “Eleonor has returned from her death!”
He opens the door hoping to see Eleonor and revive the first day they've met
Eleonor was standing at his door: but she had no colour, no blood, no breath!
Shocked by the presence, he didn't notice when she got in on her zombie steps
And she seated in the only chair in the room, her dead eyes looking to nowhere
He said, “Eleonor, you're back! Breath, my love, you need some fresh air!”
But breathless Eleonor seated on the chair, staring who knows what, who'd dare.
Suddenly she broke the silence with a grotesque sound, not a voice, but a blare,
She said: “I'm waiting you to come”, then starring at him, “I'll wait for you in this chair”
And there she seats, day after day, night after night, waiting the day Jack would die,
So she will put his corpse in a bag and walk with it, singing a known wicked moan,
to The Ancient Druid Cemetery and its cursed bones!

17.6.15

A Gostosa do Jaleco


Todo dia, 12:15, como um relógio. Ela saia para o almoço junto com outras colegas de trabalho - todas de jaleco. Desfilava confiante, exuberante, decidida, exibida, certa de sua gostosura, que o jaleco disfarçava levemente, ora cobrindo, ora mostrando. Um golpe de vento aqui e o jaleco dá uma subidinha; outro golpe de vento ali e o jaleco se amontoa para o lado. Cada movimento parece revelar uma curva diferente do seu corpo. Eu me espremo naquele boteco nojento onde ela come o PF do dia - não deve ser médica pra comer estas porcarias! - e faço hora com um café melado e requentado, às vezes dois, até três, se ela se perde nas conversas, sempre desinteressantes, sobre sangue, urina, secreções e excrementos.



Ouvi no rádio que os médicos, enfermeiros e profissionais de saúde estão proibidos de usar jaleco fora do ambiente de trabalho, e que quem desrespeitasse estaria sujeito à multa, que dobraria em caso de reincidência... Disseram que o objetivo era impedir que os jalecos servissem de fonte e veículo de transmissão de micro-organismos. Um blá, blá, blá que para mim não importava nem um pouco... Mas o que seria da gostosa do jaleco?

Nunca mais fui ao boteco.

25.4.15

10 anos

Swirling lovers 1 ~ ogle12
fisicamente longe dela
     - ela partiu de repente
abstinente de sí e de mim
num zepelim sem prumo
rumo àquele país estranho.

antanho foi a mesma sorte
parte ela antes da hora
embora amiúde nada mude.
alude-me em um email -
     galanteio eficiente -
e novamente me apaixono.

tento ligar, não consigo
exaurido caio na poltrona
dona insônia e sr. desconforto
me absorto meio desvalido
desiludido por entender tudo isso

eriço da ânsia de estar ao lado dela
que protela o tempo-pouco em tempo-muito
fortuito contratempo abismal

e nessa multidão sozinho
     resquardo-me em meu ninho
          disfarçado de normal
            .
          às vezes levanto a cabeça
     e antes que alguém apareça
respondo: tudo bom, nada vou mal.

Bodas de Estanho ou Zinco

Spectacles, Attributed to E. G. Washburne & Co.,
New York, New York, 1875-1900,
Painted white metal
(probably an alloy of zinc, lead, and tin)
Estanho.
metálico
branco-azulado & lustroso
em forma de cristais tetragonais,
        maleável
                dúctil
ou cubo acinzentado
        alotrópico
                pulverulento

Mas calmo mar, caudaloso sempre.

*

Zinco.
metálico
branco-azulado & cristalino
fraco & dútil quando puro
quebradiço quando ordinário
abunda em minerais
        zincita
                vilemita

Metabolizador de plantas & animais

*

Boda.
festa
para celebrar casamentos
se de brilhante
        se de coral
                se de cristal
também de diamante
        esmeralda
                estanho ou zinco.

estanho ou zinco
estanhou zinco
estanhuzinco
...
..
.

22.1.15

pedro, o ex-poeta

image by violscraper
desiste não pedro
essa luta é injusta
         (mas a poesia vale)
altos tombos, e sofridos
         (mas a poesia cura)
papel branco e cabeça vazia
         (mas a poesia volta)
o contador mostra nenhuma visita
         (mas a poesia é tua)

fosse eu, tiraria data e hora
arenques defumado a reiterar
a ilusão de que o tempo existe...
ora pois, já é hora de saberem: existe não!
nós, que acreditamos na força da palavra, sabemos
que o tempo é apenas um subterfúgio poético,
e que a distinção entre passado, presente e futuro
não passa de ilusão... embora teimosamente persistente.

12.11.14

Saudades de Nápoles ~ Bertha Worms
de olhos bem fechados
e mente enebriada
deixo-me entrar, por acaso
nessa melodia de transcedência

sinto-me criança ainda
acolhido pela mãe:
o lugar mais seguro do mundo
de todos os tempos
passados e futuros

só essa distância
dos que me são caros
mais esta imensidade que sinto -
maior que tudo
- não são o bastante
para conterem as lágrimas
no coração
apenas.

e essa vontade imensa
de estar lá...

12.5.14

Foi esse o sonho...

Ishtar, with her cult-animal the lion, and a worshipper
Modern impression from a cylinder seal, c. 2300 BC
In the Oriental Institute, University of Chicago
Uma mulher me falava que meu pai e minha mãe tinham sofrido um acidente. Era em Dublin, tenho quase certeza. Eu a interrogava “Onde eles estão?” e ela dispersava, “Ah, estão ali...” “Onde?”, gritava desesperado, “Ali...” e apontava displicentemente para um beco escuro, e alertava: “Mas se eu fosse você eu não iria lá...”.

Claro que eu fui.

Entro no beco e encontro minha mãe caída, desacordada, e meu pai cambaleante, tentando levantá-la. Num instante - num daqueles instantes de sonho que transgridem todas as leis da física - estávamos todos no saguão de um hospital: lembro-me bem de pai, Alê e Teresa. Tem mais gente mas não me lembro quem são, ou não vejo seus rostos. Todos estavam bem calmos, esperando não sei o quê. Eu só queria chegar ao quarto de minha mãe.

Peço informação. Era o quarto número 9, mas disseram que eu não saberia chegar lá... Mostraram-me o mapa do hospital, que parecia o James Connolly, lá de Blanchardstown, em Dublin, mas as imediações tinha a representação urbana de Barcelona, na Espanha.

Chamei Teresa para dar uma olhada no mapa, na esperança de que ela conhecesse o caminho, mas ela estava distraída... Peguei o mapa e disse “Deixa que eu me viro.” Chamei Alê para ir comigo. Ele veio, mas no caminho nos perdemos um do outro. Pedi informação para um enfermeiro-estudante - era um hospital universitário. Ele pegou o mapa, olhou, coçou a cabeça, chamou outro colega, “Não é aquele lugar onde não se pode dormir à noite?”, “Sim, lá não se dorme...”. “Tudo bem”, disse, "eu só quero chegar lá!".

O enfermeiro-estudante me conduziu, correndo um pequeno trote, entre portas e corredores. Um verdadeiro labirinto, e conforme nos emaranhávamos hospital adentro, suas alas ganhavam um aspecto de abandono, de desolamento.

Chegamos ao lugar. O enfermeiro sumiu - mais uma daquelas distorções das leis da física. A porta do quarto número 9 ficava numa parede, e parecia uma gaveta. Confuso, abro a tal porta e vejo o corpo de minha mãe. Embora ela estivesse bonita, não aguento a imagem e despenco em prantos. Retoricamente me pergunto "Por que não me avisaram antes?", já que eu tinha a impressão de que todos sabiam, menos eu.

Acordo... e me concentro em entender o sonho. O número 9.

Para quem acredita em numerologia, o 9 encerra um ciclo natural, a morte de um ciclo e as portas para o início de outro. Pode ser interpretado como o fim das ilusões ou como um recomeço.

Eu, que sou e sempre fui cético para estas coisas, acabo dando ouvido mais pela mitologia, como fenômeno popular de transformação e sua capacidade de conectar diferentes culturas através de histórias, geralmente baseadas em tradições e lendas feitas para explicar os fenômenos naturais, a criação do mundo, o universo ou qualquer outra coisa além da simples compreensão.

Nessa linha, tem um mito bem descritivo da essência do número 9: o Mito da Descida de Ishtar ao submundo. Ishtar, deusa suméria da fertilidade, do amor, da guerra e do sexo, desce ao submundo através de uma imensa caverna vertical e conforme avança os portões do inferno, um guardião retira uma peça de seu vestuário real. Quando chega ao fundo do poço, Ishtar está totalmente nua, despojada de suas armas e atributos reais, de seus símbolos de status e de realeza. Voltou ao seu estado original. Quando consegue voltar, ela está modificada - pode-se dizer que morreu e renasceu.

Está aí uma boa explicação para o meu número 9...

8.5.14

a chama que vem de fora


        Qualé, qualé, qualé quelé
de quem é a vez, a vez de quem é
do velho da velha da moça do moço
carteira celu documento e trôco

        Qalou, qalou, qalhou de qalar
do que viu não gostou e não soube falar
qala discórdia da barulhenta horda
silêncio vazio arredio e qalhorda

        De porre, de porre, só mais um gole
esfolegue e esfole caramucho no bucho
desforre ocaso da morte e desporre
s'imole em flamejar de fogo estrebucho

assyno eduardo miranda,
d este temporário porto imsseguro da Terra Brazillis,
oje, qvª-fejra, oitº dia do qvjº mez d este anno de MMXIV

22.2.14

22022014


quatorze passou por mim assim
quattuordecim - ou seria catorze?
aljorze não vesti esse ano, tanto faz
costumaz uma ou duas garrafas... estás afim?

então vai, parte outra vez, na desvalia
de alegrias brancas em areias entufadas
jornada já conhecida d'outras euforias,
ironia cruel de sereias encalhadas.

(volta pra água! volta pra água!)

*

o que seria de mim sem mim?
dois mil anos e quattuordecim,
passaste sobre mim num zepelim
sem arranjos em coroas de alecrim
não se ouviu clarim, flautim, bandolim
tampouco tamboreaste teu tamborim.

quattuordecim, quattuordecim,
teria sido eu assim tão ruim?
foste tu um querubim, quattuordecim,
te chamarias serafim ou delfim?
certamente não te chamarias benjamim.

seria isso tudo só o começo serafim,
e cobrarás ainda tua féria de festim?
certamenrte delfim cobraria-me um rim,
passaria recibo em tinta carmesim
e o compartilharia com amigos de botequim.
benjamim seria diferente, já que arlequim
sairia saltitante de seu camarim,
cruzaria o salão real em seu escarpim,
de talim travessado, perfeito espadachim,
e buscando a paz no seu jeito chinfrim,
benjamim tenta alcançar no bolso seu morim,
mas precipita-se o guarda-real, ainda mirim,
e golpeia-lhe o peito com seu espadim
pensando benjamin fazer parte de um motim.

já que benjamim não mais tocaria seu trompetin,
sua majestade real mandou publicar no pasquim
com enormes letras em nanquim dizendo assim:
"venham todos, todos venham sim,
ver o fim que deu o malandrim,
de arlequim a espadachim, venham sim,
venham ver benjamim pintado em carmesim
esparamado no chão, sujando meu marfim!
p.s.: precisa-se de arlequim-espadachim
não paga-se bem, mas não precisa saber latim."

parabéns, benjamim...
parabéns para mim!
FIM.

assyno eduardo miranda,
d este porto seguro da jlha do Eire,
oje, sabbº, vjgesºsegº dia do segº mez d este anno de MMXIV

22.2.13

22022013

As time goes by, MK Photography

Edu, Edu... lá vem você, com esse brilho nos olhos, querer dizer
que o tempo passa, o tempo voa, mas que a vida continua num boa?
Bem podia ser, não fossem os planos daqueles do andar acima,
sempre por cima de tudo: da carne seca, se dinheiro e poder é a sorte,
do destino alheio, se trata-se de decidir sobre a vida e a morte - e aí...
aí meu camaradinha, é onde poucos podem entender as vontades Daquele,
que com D maiúsculo Determina Destinos, trazendo uns e levando outros.
Não fosse isso seria mais um, daqueles dias, denovo & again,
que ainda parece ser importante pra você & + meia-dúzia, nadalém,
e embora houvéssemos perdas, ainda estás aqui, cá estás de novo,
a mesma farinha do mesmo saco, a mesma gema do mesmo ovo!
a contar anos-círios, sem se dar conta da rima pobre,
muito menos dos anos-círios passados & apagados, e o que era nobre
agora não faz diferença, que desde nascença já é bastão passado,
- é tudo cabeça - costumavas dizer, diferente de tudo,
só mais uma vez, para sempre só mais uma vez,
solitário-nauta, arauto do que buscas, interminavelmente,
na mesma desafreada caçada aos futuros hontems & passados ojes
sem todos os apegos - saudadetoda, nenhumamágoa, nada-apaga, toda-via,
- a mesma saudade que nos mata dia após dia -
se as mais altas colunas da ordem e da desordem conspiram contra o tempo,
e sabes que ainda terás que barganhar outras barganhas de vida e morte,
e nessa hora, nem os aléms dos tudos que te possam oferecer serão suficiente...

e se permitido fosse auto-plágio, diria que e quando tua hora chegar
que estejas rodeado... rodeado de ti, aquele tú-mesmo e mais todos os outros tús
que te incorporam de vez em vez, e assim amalgamar-te onipresentemente,
no sentido etéreo-futurista de uma fuga de Bach... se possível fosse sobreviver-te!

parabéns pra você.

assyno eduardo miranda,
d este porto seguro da jlha do Eire,
oje, sexª-fejra, vjgesºsegº dia do segº mez d este anno de MMXIII

2.11.12

senão de perda, de ...


É de perda, esse Natal
e igual já vi, em dezembro de 88
afoito, em minha juventude
amiúde ocupado com coisas menores
dores só de amores, embora perdas fossem,
nem de perto como as perdas
da vida inteira - dormia minha avó,
agora para sempre, enquanto minha mãe
se despencava por dentro e por fora...

agora entendo a perda da vida inteira.

29.5.12

Ciao Souza

Da direita, Souza, Roni e eu.
12 de Agosto de 1954 - 28 de Maio de 2012
Falei da passagem lá em TUDA. Aliás foi em TUDA que publiquei muita coisa inédita de Souzalopes. Creio que as últimas coisas, antes de seu afastamento (?) dos (alguns) amigos. Motivos deve ter tido... sabeselá!

Meu caro Souza, que a terra lhe seja leve, companheiro!


Soulopiana

pessonha boa pessonha
pessonha do peito pessonha
eu não falo do verbo peçonha
peçonha que falo pessonha
é peçoa pessonha que peçonha
peçonha do peito peçonha
peçonha boa peçonha
pessonha que bem peçonha
peçonha pessoña e pessonha
mais que qualquer peçoa
como já dizia o poeta
sepolazuos in letras invertidas:
peçonha carcome pessoa

2.5.12

Coming Back Home

... cheguei sim, sem mesmo saber ao certo
de onde, nem mesmo pra onde havia ido -
ido ou partido? pois partido já ando, há muito,
em migalhas, pequenos pedaços de vidas -
não lheias, alheias - que não escolhi, herdei
só herdei. e como todo homem que herda,
quando herda, herda com a honra dos homens
mesmo sabendo do risco de se perder no caminho...

Como já dizia José Américo de Almeida:
"Rejubila-me a alma repatriada. A memória pode falhar, mas no coração não há nada esquecido. Volto. Voltar é uma forma de renascer. Ninguém se perde na volta".

22.2.12

22022012


pois é, edu, chegou aquele dia again,
importante pra você & outra meia-dúzia-e-meia, mais quem?
nadalém dum ou outro, farinhas do mesmo saco, gemas do mesmo ovo,
mas o importante mesmo é que estás aqui, cá estás de novo!
a contar anos-círios, que se iluminadaos ou não nem importa tanto,
tanto que já perdeste a conta, e assim nem te dás conta
da rima pobre que acabaste de cometer - que fazer?
babalorixá agora de bastão passado - embora assumido, não herdado,
finalmente nasceste noutrem de nome joão... ah joão,
mais vivo que tú, mais nobre que um cão, tua chance de continuação
tampouco mais ou menos torto, não faz diferença...
desde nascença já te pertence, no balanço correto, quem dera,
sem eira nem beira, até parar a contagem - é tudo cabeça -
diferente de tú, esmo esborro, fidalgo incrédulo,
valgo dalgo danado de errado ou de bom, que não aprenderá jamais,
& entorta & sufoca & inibe & abafa todo discurso tosco,
só mais uma vez, para sempre só mais uma vez...
aí vais de novo & novamente, solitário-nauta,
na mesma busca desafreada, por entre os futuros hontems e os passados ojes
em todos os lugarem que possam existir, mesmo nas imundas fossas,
mesmo em todos os apegos, todas (de)formações: todamágoa, todorancor, todaraiva,
- aquela mesma que nos mata em cada dia dos nossos dias -
também lá não estão: a paz & a harmonia que procuras são únicas
e não vais achá-la assim tão fácil não, ah não vais não...
nem nas mais altas colunas da ordem e da desordem,
nem nas melhores barganhas entre a vida e a morte,
muito menos nos mais altos aléms dos tudos que te possam oferecer.

parabéns pra você.

assyno eduardo miranda,
d este porto seguro da jlha do Eire,
oje, qvartªfeira, vjgesºsegº dia do segº mez d este anno de MMXII

27.12.11

Jeremia não escrevia


Jeremia não escrevia

Jeremia não escrevia. Jeremia pouco lia e nada escrevia. Isso durante onze meses e 3 semanas do ano. Sabe-se lá o que acontecia com Jeremia que em épocas natalinas, mais precisamente na semana que antecedia o natal, se dava a escrever, compulsivamente! Embora possa parecer bom, para Jeremia era um tormento! Jeremia escrevia para por para fora... por para fora todo aquele sentimento que, de repente, brotava em seu peito, e que ele chamava de sentimento anti-natalino, que era o oposto do espírito de natal.

Quando criança, Jeremia perguntara ao pai porque não se chamava Jeremias, e o pai respondeu “Pruque tu é um só”.

Assim era o natal de Jeremia: onde as pessoas sentiam amor, Jeremia sentia ódio, onde as pessoas sentiam compaixão, Jeremia sentia desdém, onde as pessoas sentiam solidariedade, Jeremia sentia indiferença. Mas quem conhecia Jeremia sabia que ele era uma pessoa boa. Por onze mêses e três semanas do ano, Jeremia era um exemplo de amigo, colega, vizinho. Mas quando chegava aquela semana, Jeremia se transformava... ficava desesperançado, amargo, frio, indiferente, e enquanto as pessoas se confraternizavam, Jeremia se isolava. Se isolava e escrevia Jeremia. Compulsivamente.

De pequeno Jeremia não entendia muito das coisas. Um dia perguntou para mãe se o seu Manuel da padaria havia lhe batido. A mãe estranhou e disse que não, por quê? Jeremia disse que depois que seu Manuel chegou e entrou no quarto com mãe, mãe não parou de gritar. Naquele dia Jeremia aprendeu que voltar da escola mais cedo com dor de barriga significava uma surra.

Escrevia Jeremia, Jeremia escrevia. Toda aquela amargura, tristeza, desesperança... tudo ia na escrita de Jeremia, que não via a hora disso tudo acabar. Jeremia escrevia sobre a ganância das pessoas e sua conduta moral, sobre seu caráter, sua falsidade...
(...)
Mas se são de solidariedade os tempos, de compaixão e amor ao próximo, por que não realmente pregamos esses sentimentos? Por que ainda viramos as costas para um pedinte, para depois sentirmos pena? Se não adianta dar esmolas, esmolar também não vai fazê-lo nem mais nem menos miserável, ele provavelmente sabe disso, na própria pele! Mas aquele trocado pode salvar-lhe o dia – seja para um prato de comida, seja para um trago de pinga. Quem aí vai julgar?!? O que incomoda mesmo é a presença... ah, se pudéssemos simplesmente eliminá-los! Sim, a eliminação é possível, mas não como faz a polícia de certos Estados, e sim de maneira humana! E sua arma, camarada, é a consciência – igualmente toda a força e toda a fraqueza do homem. Por isso, enquanto estiver se empaturrando de perú e cerveja, não precisa pensar que tem gente remexendo o lixo e morrendo de fome, não... seria muita hipocrisia, e de hipocrisia a humanidade já está cheia. Quando estiver enchendo o rabo de perú, desejando saúde, paz, prosperidade e harmonia para os seus amados amigos e familiares, não precisa nem se esforçar muito... apenas sinta, de verdade, e carregue esses sentimentos ano afora – eu sei, é difícil, mas garanto que vai lhe doer menos...
Nos textos, Jeremia, que nunca escrevia, punha para fora essas coisas, coisas de pai, mãe e família, que não lembrava direito, pois depois que o pai havia se matado, Jeremia muito jovem, passara o resto da infância e adolescência de orfanato em orfanato... vários. Dos irmãos Jeremia não sabia – só sabia que cada um teve um destino diferente.

Geralmente Jeremia queria ver o natal passar rápido, rasteiro, mas ultimamente a coisa vinha mudando, ano após ano! Jeremia percebia que quando escrevia, punha para fora sentimentos alheios aos outros, mas também percebia que, fora da época natalina, quando não escrevia, sentia sentimentos igualmente não compartilhados... E quando concientizou-se de que isso era mais penoso do que escrever, Jeremia deixou de querer que o natal não chegasse, para desejar que o natal não acabasse. Se ele pudesse, escreveria sem parar, numa espécie de manifesto sobre essa hipocrisia toda que alimenta as pessoas, e o próprio ciclo da vida.

Estranha figura era Jonatã, o pai de Jeremia. Não chorava, não sorria. De nada reclamava, e por ninguém sentia. Diziam que ficara assim por causa de Eleonora, mulher infiel. Não teve coragem de largá-la por causa dos filhos Jacira, Jeremia, Jildete, Joel, Juvenal e Agripina. Talvez não tanto por causa de Agripina, filha bastarda, que mais bastarda ficou quando a mãe morreu dando a luz a ela. Culpa Agripina não tinha, mas na cabeça de Jonatã, a filha bastarda era sua única desculpa.

Embora Jeremia não tenha conseguido conspirar com o universo e fazer com que o natal não acabasse, conseguiu um trato melhor: manter aquela amargura, aquele desprezo, aquele ceticismo, pelo resto do ano dentro dele, e agora só escrevia Jeremia... enlouquecido, Jeremia não comia, não bebia, não falava, não dormia... Ficou conhecido como o louco que escrevia.

Quisera Jeremia que o que escrevia mudasse o que toda gente sentia, mas Jeremia sabia que não passava de utopia, e assim escrevia Jeremia, escrevia, e apenas escrevia...

23.12.11

Tá chegando...


Nem tão cedo nem tão tarde
Nunca fui de muito alarde
E todas essas luzes piscantes
Com seus glamores ofuscantes
No fundo, no fundo, me fazem mal...
Seria isso, enfim, o que chamam Natal?
Aperto de mão e tapinha nas costas?
E tudo na mesma merda, na mesma bosta?
Fazer o bem por dever não por querer?
Não fazer o mal por religião e não por convicção?
Pois doa a quem doer, e dói em mim também,
Morra quem morrer, que seja aqui ou no além.
Dinheiro não compra felicidade, nem sua nem alheia
É uma pena o espírito natalino não durar a vida inteira!
...
Nem tão tarde nem tão cedo, é sempre o mesmo enredo
Tenha um Natal mais consciencioso e menos consumista
Fora isso, muita, mas muita saúde, que o resto se conquista...

* * *

Veja também o espírito dos natais passados aqui.